17 de fevereiro de 2011

Por um triz...

Sandra Bullock, Practical Magic 1998


"Porque depois de tudo compreendi
 que aquilo que a árvore tem de florido
 vive daquilo que guarda sepultado".


 Francisco Luis Bernárdez




Sou uma sucessão ininterrupta de quases.
(qua-se) - adv. aproximadamente, perto de, por pouco, por um triz, na iminência de, a ponto de. Quase me escondi, quase me tranquei, quase cambiei o que havia de diferente pelo comum, e o extraordinário pelo útil, mas na época da juventude com a licenciosidade da descoberta, o quase não passava de uma mera fase. Mesmo assim não foi tão bom quanto podia, foi quase.
Podia ter fugido, roubado das outras o marido, me vendido, tudo aquilo que eu sentia ter escondido, os riscos que corri não ter corrido. Mas sempre fui o tipo de homem que tinha muito a perder, e mesmo sem jogar com a vida perdia e jogando com ela perdia mais ainda, e perdeu quase tudo. O quase levou tudo, mas o quase deixou sua base.
Podia não ter me tatuado, podia não ter juntado os sobrenomes, ter esquecido o seu nome, podia ter me travestido, brincado de ser seu marido, podia não tê-lo beijado, na Barbie da minha irmã jamais tocado, não ter preferido a Maga-Patalógica ao Pateta ou não ter torcido pela bruxa ao invés da moça adormecida. Ter tido mais cautela, e levado tudo menos de vencida. Mas o anormal me é muito natural, o quase aqui vira êxtase.
Podia ter terminado, podia ter começado, podia ter abandonado. Podia de tudo, podia ter ido cedo para a cama, ter comido mais coisas saudáveis, não ter bebido nem colocado o primeiro cigarro na boca, podia ter fechado a boca e emagrecido, podia ter engordado, ter deixado o corpo sarado, ter sido menos exagerado, ter gostado mais daquilo que eu era, ter me apaixonado pelo que eu fui, aceitar mais aquilo que hoje sou, ter me entregado nas mãos certas, ter me dado uma colher de chá, ter amado ele mais, e ter amado aquele menos. 
Todos os meus quases fazem parte de mim, o que conquistei segue comigo guardado, o que perdi é de vez em quando relembrado, o que quase foi meu, ou quase se perdeu segue na minha vida meio pendurado. O quase nunca é suprido, o quase pode ser resumido agora em uma frase:
Pudera nunca tivesse brilhado tanto se fosse brilhar tão pouco...




p.s. tudo nesta vida me escapou por muito pouco,
principalmente o que poderia ter sido e não foi, o quase.


2 comentários:

  1. Eu diria que vc é meu eu masculino, mas...... kkkk
    Brincadeiras à parte, gosto do que escreve..similar a uma outra pessoinha que perambula por aí..
    Bjs

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  2. me lembrou uma música: 'quase' do pato fu, rs,
    mas é q se sabe, q se os quase ñ existissem, nem se sabe quem seríamos

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